Por que a moda e a consultoria de estilo não se misturam?

Não sei se vocês acompanharam nos stories, mas semana passada, eu fui a especialista convidada para o evento Mind the Gap, organizado pela Mind Miners. A proposta do evento era apresentar os dados da pesquisa Moda e Inclusão para as lideranças de grandes empresas do mercado de moda e beleza. Meu papel era o de contextualizar a pesquisa e trazer uma visão crítica sobre o que é e o que pode ser a moda.

Se, por um lado, temos o vestir como parte da construção da nossa identidade, como forma de expressão e criatividade, por outro, temos essa moda ditadora que parece que não nos deixa outra opção, a não ser seguir padrões inalcançáveis. E entre um e outro, parece haver um abismo. E daí, como é que a gente começa a construir uma ponte sobre esse abismo?Foi daí que partiu minha fala, que foi se desenrolando entre The Gilded Age e Run DMC.

Eu adoro quando tenho essa liberdade criativa para construir um raciocínio que saia do lugar comum. Que prazer e que honra participar de eventos que se propõem a trazer esse olhar crítico – essa, sem sombra de dúvidas, é a parte mais legal do meu trabalho.Bom, mas porque eu tô contando isso aqui? Porque no dia que falei sobre o evento nos stories do Instagram, eu recebi a seguinte pergunta:

“Carol, vejo que você transita bastante entre moda e estilo. Acho isso super interessante, porque percebo que são duas áreas que não se misturam tanto. Outro dia vi uma consultora falando que ela acha que é porque consultora de estilo é muito cheia das regrinhas e que isso tá ultrapassado. Achei interessante. O que você acha?”

Achei essa pergunta ótima porque nunca tinha parado para pensar nisso. Mas ó, eu não acho que o motivo seja esse, não! Até porque, a pesquisa apresentada no evento mostra justamente que a moda ainda é pautada por regras ultrapassadas. Podemos dizer que hoje essas regras são mais implícitas do que foram no passado, mas elas ainda existem.

Quando determinados corpos não encontram roupas para comprar em qualquer lugar, isso é uma regra implícita, que determina quem pode ou não estar na moda.

Então, não acho que essa seja a grande questão.

O que eu acho é que essa história das regras ultrapassadas é só a ponta do iceberg do problema maior da consultoria de estilo, que, na minha opinião é também o que faz com que exista pouco intercâmbio entre moda e consultoria de estilo. E o problema pra mim é que, em geral, a consultoria de estilo tem pouco repertório relacionado a áreas correlatas, como a semiótica, a psicologia, a história da arte, a própria moda, entre tantas outras possibilidades.

Pra mim, é essa interdisciplinaridade que é responsável por trazer uma visão para o vestir mais complexa, mais dinâmica e menos focada em técnicas e regras.

(Acho, inclusive, que a vertente da consultoria que afirma que consultoria de estilo “é sobre gente e não sobre roupas” (vertente essa que pretende ir contra as regras ultrapassadas) ajuda a reforçar essa separação!)

Como eu falo no Styletelling, (inclusive eu acho que eu vou trazer essa aula para a comunidade Styleteller também, querem?) estilo e moda são coisas diferentes e é muito importante que a gente entenda essa diferença. Mas moda é nossa ferramenta de trabalho e precisa fazer parte do nosso repertório, só que, em geral, não é o que acontece e aí esse diálogo entre moda e estilo, que é fundamental para ambas as áreas, acaba não acontecendo.

Por fim, claro que há quem acredite e defenda essas regras nos transportam diretamente para 1950 (desculpa se você é dessa galera, mas tem post em 2022 replicando chamada de revista dos anos 50!). Mas, posso falar pela minha experiência com alunas de consultoria de estilo que tem muita gente que não concorda, mas não sabe pra onde correr. Porque foi isso que aprendeu e não tem essa outra bagagem. Uma coisa é você chutar as regras na sua vida pessoal, outra coisa é você conseguir chutar as regras sendo uma profissional da área, que precisa entregar respostas e resoluções de problemas para as clientes.

E daí vou me valer de uma metáfora que já usei num post. Vamos lá, se você quer fazer um bolo, mas não tem nenhuma intimidade com a cozinha, você, não só precisa de uma receita, como vai seguir a receita tal e qual e rezando pra dar certo!

Já para transformar com sucesso uma receita de bolo de chocolate em bolo de laranja, vai precisar de um pouco mais de intimidade com a cozinha, para fazer os ajustes necessários.

Agora, para criar uma receita do zero, é preciso um bom domínio de como os ingredientes interagem e muita experiência. Não adianta colocar alguém que mal frita hoje na cozinha e pedir pra fazer um bolo sem nenhuma instrução. Não vai acontecer. Eu sei disso, eu sou a pessoa que não sei nada de cozinha! haha

As regras, os estilos universais e todas essas obviedades são a receita de bolo. Muito úteis para quem está aprendendo, mas um tanto limitados. Para fugir disso tudo, é preciso repertório, experiência e interdisciplinaridade!

E desculpa o momento autopromoção aqui, mas, o grande diferencial do meu trabalho não é só o aprofundamento e o embasamento (isso vocês sempre ressaltam e eu fico muito feliz!), mas também a interdisciplinaridade. Afinal, eu sou formada em Design de Moda, trabalhei anos como estilista, fiz Mestrado em Comunicação e Semiótica e tenho me debruçado nos temas feminismo, moda, corpo e imagem. É isso que faz com que eu não tenha uma visão limitada da consultoria de estilo. Consultoria de estilo é um trabalho interdisciplinar, não esqueçam disso!

É esse olhar que fez com que eu criasse o Styletelling, que é um olhar para estilo a partir da Semiótica e o Corpos Plurais, que tem olhar da psicologia!

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